segunda-feira, 15 de março de 2010

Indução e conhecimento: o problema epistemológico da indução - 2

Resposta - continuação - ao post anterior


Esse princípio é o costume, o hábito. Porque, todas as vezes que a repetição de uma operação ou de um acto par¬ticular produz uma tendência para renovar o mesmo acto ou a mesma operação sem o estímulo de qualquer raciocínio ou exercício da razão, dizemos sempre que essa tendência é resultante do costume. Ao usarmos este termo, não estamos a afirmar que apresentámos a causa última de uma tal tendência. Limitamo-nos a apontar um princípio da natureza humana, universalmente reconhecido e bem conhecido pelos seus efei¬tos.
(...)
Seguramente, temos pelo menos aqui uma afirmação bastante inteligível, senão uma verdade, quando sustentamos que, após a ligação constante entre dois objectos - calor e chama, por exemplo, ou peso e solidez - somos levados, unicamente pelo costume, a esperar por um quando surge o outro. Parece que esta hipótese é a única que explica a dificuldade; porque tiramos a partir de mil casos uma conclusão que seríamos incapazes de tirar a partir de um único caso, o qual não difere em nenhum aspecto dos precedentes? A razão é incapaz de se dispersar de semelhante forma. As conclusões que tira ao considerar uma circunferência são as mesmas que tiraria ao examinar todas as circunferências do universo.
Mas, se se viu um só corpo mover-se sob impulso de um outro, ninguém inferirá que um outro corpo se movimentará sob um impulso análogo. Todas as conclusões tiradas da experiência são, pois, efeitos do costume e não efeitos do raciocínio.
Então, o costume é o grande guia da vida humana. É esse o único princípio que faz com que a nossa experiência nos sirva, é apenas ele que nos faz esperar, para o futuro, uma sucessão de acontecimentos semelhantes aos que tiveram lugar no passado. Sem a acção do costume, ignoraríamos completamente qualquer questão de facto fora do que está imediatamente presente à memória e aos sentidos. Nunca sabe¬ríamos como ajustar os meios face aos fins, nem como utilizar os nossos poderes naturais para produzir um efeito. Isso seria, simultaneamente, o fim de qualquer acção, bem como prati¬camente de toda a especulação.»
David Hume, Investigações sobre o entendimento humano, secção V

Sem comentários:

Enviar um comentário