terça-feira, 31 de março de 2009

S. Mill - crítica à felicidade como mero prazer corporal?

A escola que aceita como fundamento da moral o princípio da utilidade ou da maior felicidade possível estipula que as acções são moralmente boas na medida em que tendem a promover a felicidade, e moralmente más na medida em que tendem a promover o contrário da felicidade. Por "felicidade" enten­demos o prazer e a ausência de dor; por "infelicidade", a dor e a privação de prazer. Teremos contudo de aprofundar muito mais de maneira a dar uma visão mais clara do critério moral assim estipulado pela teoria. Teremos, em particular, de especificar o que se inclui nas ideias de dor e de prazer, e em que medida essa lista permanece uma questão em aberto. Essas explicações suplementares não vão, contudo, afectar a teoria da vida na qual se baseia esta teoria da moralidade - a saber, que o prazer e a ausência de dor são as úni­cas coisas desejáveis como fins e que todas as coisas desejáveis (tão numero­sas no sistema utilitário como em qualquer outro) o são por causa do prazer que lhes está inerente ou por serem meios para a promoção do prazer e a pre­venção da dor.
Ora, uma tal teoria de vida suscita, junto de numerosos espíritos - dos quais alguns dos mais estimáveis, pelo sentimento ou pela intenção -, uma aversão inveterada. Supor que não há fim mais nobre para a vida que o pra­zer, que não possamos desejar ou procurar nada de melhor nem de mais nobre - para retomar as suas expressões - é, na sua opinião, profundamente des­prezível e vil, uma doutrina digna apenas dos porcos aos quais os discípulos de Epicuro foram comparados com desdém na Antiguidade; também os defen­sores modernos da doutrina são o objecto de comparações igualmente pouco lisonjeadoras por parte dos seus adversários alemães, franceses ou ingleses.Stuart Mill, O Utilitarismo, Ensaio Sobre Bentham, Gallimard, Paris

Sem comentários:

Enviar um comentário