quarta-feira, 13 de maio de 2009

o Critério da Falsificação

«A investigação toma como ponto de partida os problemas. Para resolvê-los, há que inventar hipóteses que sirvam como tentativas de solução. Uma vez formuladas, há que comprovar as ditas hipóteses. E estas provam-se extraindo consequências delas e vendo se se ajustam ou não. Se se ajustam, dizemos que a hipótese, de momento, se confirma; pelo contrário, se pelo menos uma das consequências não se ajusta, diremos que a hipótese se vê falsificada. Por outras palavras, dado um problema P e uma teoria T que se propõe como solução para ele, dizemos: se T é verdadeira, então terão de se dar as consequências p1, p2, p3, ..., pn, que, se se ajustam, confirmam a teoria, e que, se não se ajustam, desmentem-na ou falseiam-na, isto é, demonstram que é falsa. Conclui-se assim que, para comprovar de facto uma teoria, ela tem de ser por princípio controlável, ou, por outras palavras, tem que ser falsificável, têm que poder-se extrair delas conse¬quências que podem refutar-se, isto é, que podem ser falsificáveis por factos. Se de uma teoria não se podem extrair consequências susceptíveis de um controlo fáctico, ela não é uma teoria científica. Isto não deve contudo esquecer que uma hipótese metafísica de hoje se pode converter numa hipótese científica amanhã (como sucedeu com a teoria atomista, que era metafísica nos tempos de Demócrito e se transformou em científica na época de Fermi).
O método dedutivo dos controlos consiste nesta extracção de consequências da teoria a controlar, e na sua comparação com as asserções de base (ou proto¬colos) que, de acordo com os nossos conhecimentos, descrevem os factos. Estes controlos, do ponto de vista lógico, nunca atingem um final definitivo, dado que por muitas confirmações que uma teoria tenha tido, ela nunca é algo certo de todo, na medida em que o próximo controlo a pode desmentir. Este facto lógico explica a história da ciência, na qual vemos teorias que resistiram durante muito tempo a ruírem perante o peso dos factos que se lhes opõem.
Na realidade, existe uma assimetria lógica entre verificação e falsificação: biliões e biliões de confir¬mações não convertem em certa uma teoria (por exemplo: “todos os pedaços de madeira flutuam na água”), ao passo que um único facto negativo (“este pedaço de ébano não flutua”) falsifica, do ponto de vista lógico, a teoria. Popper insere nesta assimetria o mandamento metodológico da falsificação: uma vez que toda a teoria, ainda que esteja verificada, pode ser desmenti da, há que tratar de falsificá-la, pois quanto mais cedo se encontrar um erro, mais cedo ele poderá ser eliminado com a invenção e a prova de uma teoria melhor do que a anterior. Deste modo, a epistemologia de Popper reconhece a força que caracteriza o erro. Como dizia Oscar Wilde, “a experiência é o nome que cada um de nós dá aos seus próprios erros”.
Isto permite-nos compreender o lugar central da noção de falsificação na epistemologia de Popper: “A um sistema científico, não lhe exigirei que seja capaz de ser escolhido, em sentido positivo, de uma vez por todas; mas exigir-lhe-ei que a sua forma lógica o permita pôr em evidência, mediante controlos empíricos, em sentido negativo: um sistema empírico deve poder ser refutado pela experiência.”»

G. Reale e D. Antiseri, Historia dei Pensamiento Filosófico e Científico, Tomo Tercero, Barcelona, Editorial Herder, 1992, pp. 894.895.

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