domingo, 20 de março de 2011

Aristóteles - Política

Excerto da História da Filosofia de Nicola Abbagnano

(...) Segundo Aristóteles, a virtude não é realizável fora da vida social. A origem da vida social está em que o indivíduo não se basta a si próprio: não só no sentido de que não pode por si só prover às suas necessidades, mas também no sentido de que não pode por si, isto é, fora da disciplina imposta pelas leis e pela educação, alcançar a virtude. Por consequência, o estado é uma comunidade que não tem em vista apenas a existência humana, mas a existência materialmente e espiritualmente feliz; e é este motivo pelo qual nenhuma comunidade política não pode ser constituída por escravos ou por animais, os quais não podem participar da felicidade ou de uma vida livremente escolhida (Pol., 111, 9, 1280 a). E a este propósito Aristóteles sustenta que há indivíduos escravos por natureza enquanto incapazes das virtudes mais elevadas e que a distinção entre escravo e livre é tão natural como a que existe entre macho e fêmea e jovem e velho (lb., L, 13, 1p60 a).

Entre os que, como Platão, se limitam a delinear um tipo de estado ideal dificilmente realizável e aqueles que, por outro lado, vão em busca de um esquema prático de constituição e o descobrem em qualquer das constituições já existentes, o problema fundamental é o de encontrar a constituição mais adaptada a todas as cidades: "É necessário ter em mente um governo não só perfeito, mas também realizável e que possa adaptar-se facilmente a todos os povos" (Pal., IV, 1, 1288 b). É necessário portanto propor uma constituição que tenha a sua base nas existentes e vise realizar nela correcções e mudanças que a aproximem da perfeita. Por isso a Política de Aristóteles culmina na teoria da melhor constituição exposta nos dois últimos livros; mas a esta teoria chega ele mediante a consideração crítica das várias constituições existentes e dos problemas a que dão origem. Viu-se que Aristóteles recolheu umas 158 constituições estatais, das quais, no entanto, só uma, a de Atenas, foi encontrada. Evidentemente, deve -ter-se servido deste material para as observações que veio fazendo sobretudo nos livros IV, V, VI, da sua obra, que aparecem compostos mais tarde.

Como Platão, Aristóteles distingue três tipos fundamentais de constituições: a monarquia ou governo de um só ; a aristocracia ou governo dos melhores; a democracia ou governo da multidão. Esta última chama-se política, isto é, constituição por antonomásia, quando a multidão governa para o bem de todos. A estes três tipos correspondem outras tantas degenerações quando o governo descuida o bom comum em favor do bem próprio. Com efeito a tirania é uma monarquia que tem por fim o bem do monarca, a oligarquia tem por fim o bem dos possidentes, a democracia o bem dos pobres: nenhuma visa a utilidade comum. Na realidade, pois, cada tipo de constituição pode tomar caracteres distintos. Não existe uma só monarquia e uma só oligarquia, mas estes tipos diversificam-se segundo as instituições nas quais se realizam. Existem também distintas espécies de democracia segundo o governo se funda na igualdade absoluta dos cidadãos ou se reserve a cidadão dotados de requisitos especiais. A própria democracia transforma-se numa espécie de tirania quando em detrimento das leis prevalece o arbítrio da multidão. O melhor governo é aquele em que prevalece a classe média, isto é, o dos cidadãos possuidores de uma fortuna modesta. Este tipo de governo é o mais afastado dos excessos que se verificam quando o poder cai nas mãos dos que nada possuem ou daqueles que possuem demasiado.

Ao delinear a constituição melhor, em conformidade como o princípio de que todo o tipo de governo é bom, enquanto se adapte à natureza do homem e às condições históricas, Aristóteles não se limita a descrever um governo ideal, mas determina as condições pelas quais um tipo qualquer de governo pode alcançar a sua forma melhor. A primeira e fundamental condição é que a constituição do estado seja tal que proveja à prosperidade material e à vida virtuosa e feliz dos cidadãos. A este propósito têm-se presentes as conclusões da Ética, isto é, que a vida activa não é a única vida Possível para o homem e nem tão-pouco a mais alta e que ao lado dela e acima dela está a vida teorética. Outras condições referem-se ao número dos cidadãos que não deve ser nem demasiado elevado nem demasiado baixo, e às condições geográficas, isto é, ao território do estado. Depois é importante a consideração da índole dos cidadãos que deve ser corajosa e inteligente como a dos Gregos, que são os mais aptos a viver em liberdade e a dominar os outros povos. Também é necessário que na cidade todas as funções estejam bem distribuídas e que se formem as três classes fundamentais, segundo o projecto de Platão, do qual Aristóteles exclui, no entanto, a comunidade da propriedade e das mulheres. É necessário além disso os anciãos, que no estado mandem, pois que ninguém se resigna sem amargura às condições da obediência se esta não é devida à idade e se não sabe que alcançará, com a idade, a condição superior. Finalmente, o estado deve preocupar-se com a educação dos cidadãos que deve ser uniforme para todos e dirigida não só a adestrar para a guerra mas a preparar para a vida pacífica, para as funções necessárias e úteis e acima de tudo para as acções virtuosas.

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