quinta-feira, 27 de maio de 2010

A TV (e a net?), a palavra e a in-capacidade de pensar

A rádio, o cinema e a televisão fizeram desaparecer radicalmente a distância que o leitor é obrigado a observar quando lê um texto imprimido – distância que exigia a assimilação de carácter privado, sendo ao mesmo tempo a condição necessária de uma esfera pública onde tinha lugar uma troca reflectida sobre o que se tinha lido. Os novos media transformam a estrutura da comunicação enquanto tal; o seu impacto é, nessa medida, mais penetrante, no sentido literal do termo, que não foi nunca aquela da Imprensa. O comportamento do público transforma-se também sob o constrangimento do “don´t talk back”*, dado o facto das emissões, tal como são difundidas pelos novos media, reduzirem singularmente a possibilidade que os seus destinatários têm de reagir, o que não se verifica em tal grau com as informações imprimidas. Os novos media cativam o público dos espectadores e dos auditores, retirando-lhes ao mesmo tempo toda a «distância emancipadora (Mündigkeit)», isto é a possibilidade de tomar a palavra e de contradizer. O uso que o público dos leitores fazia da sua razão tende a esfumar-se em prol das simples «opiniões de gosto e inclinação» que alteram os consumidores: e mesmo o facto de se falar daquilo que consumimos, essa «contra-prova das experiências do gosto», é integrado no próprio processo de consumo.
Esse universo produzido pelos mass media não tem senão a aparência de uma esfera pública; assim como é igualmente ilusório que permaneça intacta a esfera privada que ela deveria garantir aos seus consumidores.»

Habermas, Jürgen, L´espace public, Archéologie de la publicité comme dimension constitutive de la sociéte bourgeoise, Éditions Payot, Paris, 1992, p.179

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