terça-feira, 6 de março de 2012

O que é a Ética?

Isaque Tomé

Contributos para uma definição de Ética
            Etimologicamente, ética provém de dois termos gregos: éthos e êthos e pode ser entendida num duplo significado (Enciclopédia LOGOS, 1990): costume, uso ou modo visível de proceder e morada habitual, relacionando-se, assim, com o espaço íntimo de cada indivíduo. Mais especificamente, o primeiro sentido apontado relaciona-se principalmente com modos habituais de proceder na relação com os outros. Já o segundo aponta para uma perspetiva mais individual que considera o que é específico de cada um, nomeadamente, o seu modo de ser ou caráter, entendido num plano de reflexão sobre o modo de agir em função do bem e para o bem. Inserida dentro desta segunda definição, ethos tem como objecto os valores e princípios norteadores da boa conduta humana. 
              A ética remete para uma reflexão sobre os princípios que orientam a acção humana e para os fundamentos que regem a constituição de normas morais, propondo fins e ideais a realizar tendo em vista o aperfeiçoamento do ser humano.
            É precisamente a sua duplo sentido que leva alguns autores a considerarem sinónimos os conceitos de ética e moral. Porém, tal consideração é feita comparando ethos, de origem grega, e mores, proveniente do latim, traduzindo, assim, um mesmo significado ligado ao costume e modo de proceder. O conceito de ética tem sofrido alterações ao longo da história. Assim, se na antiguidade os filósofos a consideravam como o estudo dos meios para se alcançar a felicidade (Aristóteles, por exemplo defendia que a felicidade se conseguiria alcançar através da prática duma vida virtuosa, e Platão considerava que o homem só alcançaria a libertação do drama da condição humana através do conhecimento), já na Idade Média a ética confundiu-se com a moral, privilegiando princípios religiosos. No século XVIII, Kant defende que a lei moral (dever) orienta toda a ação do ser racional. Mais tarde os filósofos retomaram a ideia anteriormente defendida na antiguidade, abandonando os conceitos ligados à religião, mas tendo como princípio o pensamento humano.
            Enquanto tem um objeto de estudo autónomo face a outros saberes, a ética é ainda considerada como um ramo da Filosofia que aborda questões de moralidade, isto é, conceitos como o bem e o mal ou o certo e errado, o correto ou o incorreto. Está ligada a aspetos do comportamento humano, ao modo como conduzimos a nossa vida, como seres racionais, sendo que o seu referencial é o Bem, o Certo, o Correto.
            Atualmente, a distinção entre ética e moral costuma ser apresentada do seguinte modo: A) moral designa o âmbito da formação de normas obrigatórias e da sua hierarquização e aplicação a casos concretos, a moral, traduzindo-se na prática comportamental, é circunstancial e mutável, e está dependente dos contextos, das épocas, das sociedades, das religiões. B) ética existe como uma referência para os seres humanos em sociedade e, por isso, nos remete para uma reflexão acerca dos princípios que devem orientar a ação humana, para a fundamentação das normas que orientam a ação, para a definição dos fins e ideais que orientam ou devem orientar a existência, tendo em vista o aperfeiçoamento do ser humano.
            Importa ainda convocar Arêdes (2005:5), pela definição que propõe à margem da categorização tradicional, “enquanto a moral, porque judicativa, tem uma vocação casuística, a ética, porque propiciadora de princípios, tem de ser capaz de apresentar modelos de transformação (do agente), manifestando uma vocação ontológica, propondo o que se deve ser como condição do que se deve e pode fazer. Dito de outro modo: enquanto a moral indica o que se deve fazer, a ética indica o que se deve ser. “
            Assim, o dever que sentimos (na consciência moral) quando é exterior à nossa vontade é do domínio da Moral. O dever que nós nos impomos a nós mesmos (ao nível de uma vontade racional) por considerarmos que é o mais correto, e tem origem na nossa consciência, é do domínio da Ética.
            Confrontada com uma série de práticas morais já em vigor e, partindo delas, a ética procura determinar a essência da moral, a sua origem, as condições objetivas e subjetivas do ato moral, as fontes da avaliação moral, a natureza e a função dos juízos morais, os critérios de justificação destes juízos e o princípio que rege a mudança e a sucessão de diferentes sistemas morais.
            A ética como reflexão filosófica pode apresentar três dimensões:
1ª - disciplina descritiva do fenómeno moral;
2ª - teorização  prescritiva do que deve ser a moral;
3ª - reflexão pessoal que enquadra a  decisão concreta.
            A ética, em sentido lato, resulta da interação do homem com o seu ambiente e o seu semelhante na medida em que se consubstancia na interpelação permanente.
            A filosofia atual, numa tentativa de enquadramento sistemático e abrangente, subdivide a ética em três componentes relevantes: metaética, ética normativa e ética aplicada. Em filosofia, metaética é o ramo da ética que procura entender a natureza das propriedades éticas, enunciados, atitudes e juízos. Enquanto as éticas normativas formulam respostas para as questões como "o que alguém deve fazer?", endossando assim algumas avaliações éticas de valor e rejeitando outras, a metaética formula questões como "O que é o bem?" e "Como podemos dizer o que é bom e o que é mal?", procurando entender a natureza das propriedades e avaliações dos enunciados éticos. A ética aplicada é um estudo de ordem ética que atua num meio social, o seu comportamento e a sua aplicação nesse meio.
            

Referências
Arêdes, J (2005).Ética e Consciência. Philosophica, nº25, p 7.29.Faculdade de Letras da Universidade de Lisboa.
Enciclopédia Luso-Brasileira de Filosofia - Logos (1990). Editora Verbo

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