sábado, 12 de novembro de 2016

Vencededor - Ensaio Filosófico no Ensino Secundário – 2.ª Edição APF

No link abaixo
o acesso ao ensaio vencedor,
da autoria do aluno do ensino secundário Thomas Child,
com o título Uma encruzilhada do século XXI – Tecnologia e Humanidade,
promovido pela Associação de Professores de Filosofia.

http://www.apfilosofia.org/noticias/ensaio-filosofico-no-ensino-secundario-2-a-edicao-vencedor-2


segunda-feira, 10 de outubro de 2016

A importância da lógica


«Um argumento é válido se tiver a seguinte propriedade: se as premissas forem verdadeiras, a conclusão será verdadeira. Por que razão estamos especialmente interessados na validade? Acontece que a validade é uma propriedade fundamental do argumento. Pois se o leitor raciocinar validamente e se partir de premissas verdadeiras, nunca será conduzido ao erro. Os argumentos válidos preservam a verdade. Se começar com verdades e raciocinar validamente, aquilo a que chegar será verdade.»

H. W.Newton-Smith, Lógica

sábado, 8 de outubro de 2016

A insuficiência da tabela de verdade e o Inspetor de circunstâncias.

A tabela de verdade aplicada aos argumentos pode dizer-nos se estes são tautológicos, contraditórios ou contingentes.

A tautologia e a contradição na maioria dos argumentos é evidente, percebemos intuitivamente,  qual o seu valor lógico.

O problema apresenta-se nas contingências - o que significa que o argumento pode ou não ter condições para ser válido. 
Ora, acontece que se submetermos esse argumento ao inspetor de circunstâncias, rapidamente saberemos se é válido ou é inválido.

O inspetor de circunstâncias é adequado para avaliar a validade lógica do argumento.
A tabela de verdade é muito mais adequada para determinar equivalências entre proposições.


A formalização simbólica de proposições e argumentos. EXEMPLOS

Nota: por problemas de software a conjunção tem o símbolo &.

Atividade: Formalizar argumentos - associa a cada um a formalização correspondente abaixo apresentada.

Ponto de Partida: 1ª tarefa: identificar a CONCLUSÃO do argumento. Esta tarefa é a mais enganadora: pensamos ser fácil e muitas vezes não é.

a) Se souber lógica, então saberei avaliar o argumento. Sei lógica. Daí que saiba avaliar o argumento.

b) Se souber lógica, constato a validade deste argumento. Mas não constato a validade deste argumento. Logo, não sei lógica.

c) Se for à praia e tomar banho, leio um livro. Sucede que não leio um livro, portanto não vou à praia e tomo banho.

d) Está a chover, uma vez que se não chovesse as pessoas não estavam molhadas e as pessoas estão molhadas.

e) A Ana não está contente, pois quando tira positiva num teste fica contente e sempre que fica contente canta. Acontece que a Ana não canta. 

((~P → ~Q) & R) → P
((P → Q) & P) → Q
((P → Q) & ~P) → ~Q
((P & Q) → R) & ~R) → ~ (P & Q)
(((P → Q) & (Q → R)) & ~R) → ~Q

Definição de Filosofia


Catarina Oliveira - 10.º C

sábado, 18 de junho de 2016

Arte contemporânea

Vamos caminhar sobre as águas com a ajuda de Christo

autoria Stefano Rellandini/Reuters           // data 16/06/2016 - 14:32



Christo e Jeanne-Claude — o casal usa os dois nomes juntos desde 1994 — estão a alterar a paisagem do Lago Iseo, em Itália. Depois de terem embrulhado monumentos e vales, de terem rodeado ilhas e tapado caminhos e vedações, os artistas decidiram voltar a Itália, onde não "embrulhavam" há cerca de 40 anos. "The Floating Piers" (o cais flutuante) consiste na colocação de 70 mil metros quadrados de tecido amarelo brilhante, esquema que estará assente numa doca flutuante modular de 200 mil cubos de polietileno de alta densidade e que deverá ondular com o movimento da água. Durante 16 dias, os visitantes poderão caminhar sobre esta obra de arte de três quilómetros, desde Sulzano até Monte Isola, passando pela Ilha de San Paolo. As montanhas que cercam o lago oferecem uma visão panorâmica de "The Floating Piers", expondo ângulos despercebidos e alterando perspectivas. Após a exposição, todos os componentes serão removidos e reciclados industrialmente.


Medicina e ética


http://expresso.sapo.pt/sociedade/2016-06-18-Uma-facanha-extraordinaria-como-a-etica-fez-nascer-o-bebe-esperanca-1

A vida é um bem a ser cuidado. A morte é um instrumento para chegar à vida. E a ética tem de servir para ligar a morte e a vida. Foi assim, que, numa manhã de segunda-feira, decidiu-se prolongar a morte de uma mãe para fazer nascer um filho que ela nunca veria. Nem o médico que o salvou. Nem viu, nem vai ver, porque a ética não pode depender da espuma das emoções. É de outro patamar, do distante. A palavra ao pediatra que salvou o bebé que comove Portugal
Um homem não se separa da circunstância e Gonçalo Cordeiro Ferreira é, antes do mais, um pediatra. É o médico das crianças. É também diretor do Hospital D. Estefânia e presidente da comissão de ética do Centro Hospitalar de Lisboa Central. Naquela sexta-feira, 19 de fevereiro deste ano, quando uma mulher grávida e em coma deu entrada no hospital de S. José, em Lisboa, ele ainda era o vice-presidente do organismo que tomaria uma decisão que entrou para a história da medicina portuguesa e cravou a sua marca na literatura clínica mundial.
Subscreveu a “decisão pró-vida”, uma opção em prol da sobrevivência de um feto de 17 semanas totalmente dependente do corpo de uma mãe que já morrera em consequência de uma hemorragia cerebral. Gonçalo Cordeiro Ferreira nunca viu aquela mulher. Nunca olhou para uma fotografia daquela criança. Um homem que não acredita em milagres, mas que defende a esperança.
Como é que tudo começou?
A 21 de fevereiro, sábado, a comissão de ética encontrava-se em reestruturação porque o anterior presidente, dr. António Santos Castro, estava em vias de se aposentar e ainda não tinha sido nomeada formalmente uma nova comissão. Fui contactado pelo diretor clínico do serviço de Neurocríticos do Hospital de S. José e informado de que havia uma senhora em morte cerebral, grávida, e que a primeira avaliação do bebé mostrava que era um feto que tinha todo o comportamento ecográfico e biomédico bem, assim como a placenta. Não havia lesões visíveis. Era um feto de 17 semanas que, se fosse retirado de dentro da mãe, não teria nenhuma viabilidade. E havia a necessidade de saber o que se iria fazer com esta senhora, que era mantida em suporte de vida. A ‘velha’ comissão de ética reuniu-se então no dia seguinte. Entretanto, informamo-nos do que se passava e recolhemos informação sobre uma situação bastante insólita e rara. Depois de um debate de algumas horas, elaboramos, por unanimidade, um parecer que foi enviado ao conselho de administração.
O que dizia o parecer?
Em primeiro lugar, que se tratava de um feto de 17 semanas que não pode sobreviver fora da barriga da mãe. De uma mãe que tinha reiteradamente afirmado que queria manter a gravidez, apesar de ter uma doença. Em segundo lugar, foi uma decisão classificada ‘pró-vida’ que nos fez decidir pelo feto. Porque se uma pessoa em morte cerebral é mantida viva em nome de um milagre, é claramente um processo de futilidade terapêutica, porque sabemos que não terá qualquer recuperação. A consulta da literatura mostrou que, embora não haja muitos casos, é possível ter sucesso em casos como este. Até às dez semanas, o feto fica à disposição da mãe, que pode decidir ou não o prosseguimento da gravidez. A partir daí, só pode interrompê-la se houver malformações ou perigo para a saúde da mãe reconhecido por uma comissão científica. O terceiro ponto pedia que o feto fosse monitorizado constantemente para detetar quaisquer indícios de que o momento do acidente cerebral que custou a vida à mãe pudesse ter afetado o bebé e que este pudesse desenvolver malformações. Finalmente, também se sublinhava que o caso tinha de ser entregue ao Ministério Público, que poderia ter de tomar uma medida cautelar em relação ao feto.
Tinham alternativas do ponto de vista legal?
Existe aqui um grande vazio legal. Para todos os efeitos, esta senhora tinha um óbito declarado. O problema é que o feto não tem personalidade jurídica.
Esse argumento não foi invocado?
Não, o bebé foi considerado um bem jurídico. A vida é um bem e era uma vida que já estava além do período em que poderia ser disposta pela mãe. Não temos muitas opções. É evidente que havia risco. Daí a continuada monitorização do feto para perceber se surgiam anomalias incompatíveis com uma vida em qualidade. Imaginemos que a mãe desenvolvia uma infeção e o bebé morria. O que se tinha perdido? Tempo, a utilização de uma máquina. A colheita de órgãos só poderia ser feita se houvesse condições. Há sempre que equilibrar o certo e o incerto e o certo era aquela vida. Não foi um aventureirismo.
Não foi inédito?
Em Portugal foi, e em termos mundiais não é muito frequente, só há uma referência na Arábia Saudita, onde o bebé nasceu uma semana antes deste.
Foi uma experiência médica?
A comissão de ética não se baseia nesses raciocínios. É uma terapêutica experimental, o que não quer dizer que seja uma experiência, porque se houvesse deteção de anomalias poderia invocar-se a interrupção da gravidez por motivos de malformações fetais. Esta salvaguarda estava assegurada.
Então porquê pedir a intervenção do Ministério Público (MP)?
As informações que tínhamos na altura eram escassas em relação à família, que estava em choque e sabíamos pela equipa médica que tratava da mãe, que a relação com o pai era recente, não sabíamos se era estruturada. Perante a possibilidade de haver uma contradição com a opinião da família, o que se decidiu - e esta é a decisão que reputo mais ousada - foi equiparar este feto a um menor em risco e dar disso conhecimento ao MP. A fundamentação é de que quem protege o feto é a mãe e esta mãe está morta, não pode proteger o seu bebé. Mas também a equipa médica precisava de uma tutela superior, que teria de ser o Estado, se não houvesse acordo com a família. Daí ter-se dito ao MP que não se trataria de uma personalidade jurídica mas de um bem jurídico. Uma vida que não está protegida. Entretanto, a família mostrou ter vontade que a gravidez fosse para frente, mesmo sendo uma situação muito complicada.
A família não deveria ter assinado um consentimento informado?
Não concordo, porque a senhora estava morta. E o bebé não é propriedade de ninguém. Está tutelado pela família enquanto menor e pode ser retirado da família se esta não exercer corretamente a sua missão. O feto não é do pai. Seria da mãe, com reservas até às dez semanas. Felizmente, todos concordaram, mas mesmo que não o tivessem feito, a gravidez poderia continuar.
Esta decisão é única?
Vou falar transcendendo o papel na comissão de ética, porque sou pediatra e uma pessoa não se pode desligar da sua condição. Este caso foi uma façanha extraordinária. A equipa de neurocríticos fez um trabalho tecnicamente perfeito, em condições muito complicadas, sem experiência. Compreendo que esta seja uma decisão muito complicada, porque as equipas médicas lutam para salvar vidas e não para manter mortos. E neste caso só lutaram para manter esta morta em situação de vida temporária porque sabiam que estava lá uma vida a crescer. Só fazia sentido se o bebé nascesse bem. Se não tem acontecido, teria sido uma enorme deceção. Uma sensação de tempo gasto porque o que aconteceu foi ao arrepio da prática médica. Ficaram muito aliviados quando viram o até então invisível bebé. Foi fantástico. Foi possível manter o bebé com o que ele necessitava para crescer, mas havia coisas que faltavam. Acordar, dormir, estar dentro de casa, comer e estar em jejum, estados emocionais que não se transmitem, mas são modulados pela libertação de hormonas que ali não havia. E há a fala, a música, que os bebés ouvem na barriga da mãe. Neste caso isso não existiu, com que consequências, não sabemos. Mas a equipa, sobretudo de enfermagem, fez um papel de comaternidade.
Sem nenhum protocolo?
Sem nenhum protocolo. Primeiro porque isso não vem nos manuais técnicos. Iam ao quarto, falavam com o bebé, levavam música, faziam festinhas na barriga da mãe. Mostra-nos que a maternidade não é uma ação individual, é de toda uma comunidade. Aqui, começou na fase pré-natal. A ética repousa nos bons princípios do homem como animal social. E essa equipa mostra isso, na vontade de o homem fazer bem ao seu semelhante.
Nunca se arrependeu da decisão? 
Nunca.
Fica aborrecido quando chamam à criança “bebé-milagre”?
Não há milagres, mas que o bebé é um grande marco, é. Preferia chamar-lhe bebé-esperança. Foi fruto de uma esperança que não foi aventureira, foi baseada em indicações concretas.
Alguma vez foi visitar a mãe?
Não.
Visitou o bebé?
Não.
Vai?
Não.
Porquê?
A comissão de ética precisa de estar distante do que é esta espuma das emoções. Tem de estar noutro patamar, em que as deliberações têm de ser mais tranquilas apesar da urgência da situação.
Ele não vai ser seu doente?
Não.

terça-feira, 15 de março de 2016

Ensaio em Ética e Filosofia

III Edição do Prémio Nacional do Ensaio em Ética e Filosofia

Associação Portuguesa de Ética e Filosofia Prática - APEFP, com o objetivo de sensibilizar os jovens para a reflexão e a criatividade, lança, este ano letivo de 2015/2016, a III Edição do Prémio Nacional do Ensaio em Ética e Filosofia Prática.
Este concurso destina-se a alunos e alunas dos Cursos Científico-Humanísticos do ensino secundário dos estabelecimentos de ensino públicos e do ensino privado e cooperativo.
O Prémio tem como objetivo eleger, sob um critério de mérito, o melhor ensaio, submetido pelas escolas a concurso, sobre um problema ético e/ou filosófico prático, ou seja, remetendo para questões que interessam a toda a sociedade, e este ano é subordinado ao tema:
O que pode fazer a Filosofia pela Tolerância e Paz Mundial?
As candidaturas poderão ser apresentadas pelas escolas à APEFP até ao dia 31 de março de 2016.
Destacando a importância das duas edições anteriores, divulga-se esta iniciativa, relembrando a possibilidade serem entregues aos concorrentes:
- Prémios monetários para o Ensaio vencedor e para o Ensaio com Menção Honrosa.
- Publicação dos Ensaios em Livro, a editar em Junho de 2016.
- Diplomas.
- Entrega dos Prémios em Cerimónia Pública.
Para mais informações, consultar o Regulamento em: http://www.apefp.org/

http://www.dge.mec.pt/noticias/ensino-secundario/iii-edicao-do-premio-nacional-do-ensaio-em-etica-e-filosofia

Mutilação Genital Feminina



Ana Luísa e Madalena

10.º E - Economia
Parte de um trabalho sobre Valores e o diálogo de culturas.

quarta-feira, 24 de fevereiro de 2016

Dogmatismo e cepticismo

O dogmatismo e o cepticismo são duas posições filosóficas que respondem de forma diferente ao seguinte problema filosófico: é possível o homem conhecer a realidade?

dogmatismo é a posição que acreditar no que a nossa mente representa correctamente a realidade e toma tal como inquestionável. Enquanto posição filosófica é a posição que resulta da crença absoluta na razão e no conhecimento que dela resulta.

O dogmatismo pode apresentar ainda duas outras dimensões/naturezas:
A) crença inquestionável fruto da ingenuidade - realismo ingénuo
C) dogmas de fé.

O Cepticismo é a posição que dúvida sobre a possibilidade do homem conhecer a realidade.

São chamados Cépticos os que defendem o cepticismos radical: defendem que o homem não tem possibilidade de conhecer a realidade. como consequência o homem deve suspender o juízo. a ignorância é total.

Descartes não é um ceptico, é sim um filósofo que usa a dúvida para conhecer - daí a designação de dúvida metódica.

terça-feira, 12 de janeiro de 2016

2015 - The 800th Anniversary of the Magna Carta

2015 - The 800th Anniversary of the Magna Carta: The 800th anniversary of Magna Carta is an occasion to deepen our understanding of the crucial role it has played in the development of human rights, democracy and liberty. 2015 is a time to commem...

A função da cultura - entrevista a Eduardo Lourenço





O Expresso vai disponibilizar, já a partir do dia 16 de janeiro, o livro “Cultura — Tudo o Que É Preciso Saber”, do alemão Dietrich Schwanitz. Dividido em seis volumes, a serem distribuídos gratuitamente por todos os leitores do Expresso, trata-se de um projeto ambicioso: resumir a cultura ocidental em 647 páginas, sem grandes floreados e percorrendo as suas várias vertentes — histórica, literária, artística, filosófica. A ideia é ajudar o leitor a construir uma noção de “cultura geral” e a orientar-se na infinidade de caminhos possíveis para lá chegar, com conselhos práticos sobre livros e leituras. Fala-se de cosmogonias, de Homero, da Bíblia, da Idade Média, da modernidade, de revoluções, guerras e democracia. Da evolução das artes e da escrita, das grandes obras que servem de chão ao nosso presente. O primeiro volume desta coleção intitula-se “Da Antiguidade Clássica à Idade Média” e tem introdução de Eduardo Lourenço. Neste texto, o professor leva-nos a compreender por que razão um livro destes é necessário logo hoje, o tempo da suprema distração, do “presente que a si mesmo se basta” e das aparências que mascaram o real.

Cultura não pode ser uma luz que ilumina uns quantos enquanto o resto permanece na sombra. Para Eduardo Lourenço, a cultura é, antes, “o diálogo da humanidade consigo própria”. Porém, esse diálogo está hoje a ser esvaziado em função de uma distração sublime, de um olhar em frente que confunde com a realidade as sombras projetadas no fundo da caverna. Sim, Platão é para aqui chamado. E Comte, Lévi-Strauss, Kierkegaard. O professor prefaciou Schwanitz e imprimiu-lhe um tom mais cauteloso. Afinal, de que falamos quando falamos de cultura?

O título do livro de Dietrich Schwanitz é “Cultura — Tudo o Que É Preciso Saber”. O que é preciso para ser-se culto?
Seria melhor se fosse “tudo o que convém saber”. Porque a cultura não tem o monopólio do que é preciso ou não saber. Ela é o lugar onde se discute o sentido de tudo quanto somos capazes de fazer. E, como tal, a cultura não é a resposta, é a questão. A questão que a humanidade tem consigo própria. Antes dos gregos, civilizações mais arcaizantes não tinham essa exigência autocrítica, de se discutirem a elas próprias. E nós, enquanto herdeiros dos gregos, reservamos-lhe um lugar matricial. Nascemos de uma cultura de diálogo, ou pelo menos essa era a nossa convicção no século XIX. É por isso que o título do livro é importante: porque descobrimos que a cultura também é aquilo que separa, que divide os homens entre cultos e não cultos. Hoje, cada um pensa que a cultura é dele. Mas nada justifica esta pretensão de que os outros estão numa espécie de sombra. Uma das pessoas mais lúcidas a pensar sobre isto foi Claude Lévi-Strauss. Para ele, tudo é cultural. Porque o homem é um ser falante e pensante.

A cultura é uma construção?
É uma construção que nunca esteve ausente. E em vez de ser a maneira mais autocompreensiva de a humanidade se entender e de entender tudo quanto faz, de ser uma leitura do mundo, está a transformar-se numa espécie de luz imposta, tão ofuscante que acaba sendo rejeitada. Por outro lado, cultura é também isso: a tentativa de separar o que é sombra do que é luminoso, o aceitável do inaceitável.

Uma espécie de validador?
É uma espécie de diálogo, o da humanidade consigo própria. Veja que, de alguns anos para cá, apareceu o conceito de ‘contracultura’. Ou seja, uma parte da humanidade, particularmente os jovens, exprime o que sente de uma forma diferente da chamada ‘cultura culta’ — tradicional, herdada da Grécia e, no Renascimento, mitificada e promovida a um ideal. Esta contracultura pode parece bárbara, mas é uma cultura. Não podemos escapar ao cultural.

Hoje temos acesso a quase tudo. Somos mais cultos?
A cultura não tem um padrão. Não há nada que meça o que é ou não cultural. Em todo o caso, o destino da humanidade é o de distinguir sem cessar, e o ser humano é o ser da escolha. E o que é cultura depende daquilo que somos, em termos individuais e coletivos. Não há um paradigma, ‘uma’ cultura.
Porém, Dietrich Schwanitz tenta defini-la, ao dizer que a cultura é “a compreensão da nossa civilização” ou “o conhecimento que sabe avaliar-se a si mesmo”.
Penso que todas as grandes culturas, e não só a ocidental — que a certa altura parecia uma exceção no meio de culturas confrontadas com questões de sobrevivência vital — são um espaço de ócio. A cultura nasceu quando os homens criaram uma resposta à coisa mais insuportável de todas: o tédio. O tédio é um tempo sem matéria, uma matéria nula em que nada se passa. Pascal disse que a infelicidade da humanidade é a incapacidade de estar sozinha num quarto. É não se contentar com o que está à volta ou com as coisas urgentes que a solicitam e que deveriam ocupá-la. A cultura é, assim, a invenção contínua de respostas para a expulsão do não-sentido.

O autor dedica o livro aos que se sentem desiludidos com um sistema educativo em crise e sem relação com a vida. Da educação advém a cultura?
Essa espécie de música, de lengalenga, sempre existiu. Mas houve um tempo em que a educação era um privilégio de certas classes, e a distribuição do saber não era igualitária ou codificada de forma a todos poderem participar. Isso modificou-se quando Rousseau a colocou no centro da formação humana. A educação passa a ser o espaço — e a prática — através do qual o homem se vive a si mesmo e se torna exigente em relação ao que lhe é proposto como sendo evidências, que se podem discutir e até transformar.

A cultura implica um passado e uma memória. Ter cultura não significa sempre recuar?
Somos herdeiros de uma série de discursos sobre nós próprios. E pouco a pouco ficou assente que há um caminho real e outros subalternos, saberes de segunda ordem, que aparecem em relação aos dominantes como qualquer coisa de inferior. Ora, a cultura verdadeira não é secundarizante. Temos de evitar duas coisas: a apologia de um saber que, de forma mitificada, se assume como o incontornável absoluto para os iniciados na cultura; e a determinação do que seria um ‘mínimo vital’ na ordem da cultura, ou seja, as migalhas distribuídas generosa e caritativamente ao resto da humanidade menos privilegiada. Não, a cultura é, em si, o absoluto que o homem pode atingir.
O livro divide-se em duas partes, saber e poder. Juntos, estes termos têm um significado político: evocam a função da cultura como capacitação do indivíduo para fazer as suas escolhas.
A divisa do positivismo de Auguste Comte era ‘saber é poder’. No tempo das sociedades antigas, guerreiras, o poder era um poder fáctico, era a capacidade de dominar o outro. A história não é um conto de fadas, é extremamente violenta. E a cultura, digamos, é uma resposta que estabelece um espaço diferente dessa violência radical, original, do mundo. A cultura é a barca que construímos para acedermos a um destino que pensamos ser mais adequado à humanidade.

Uma sociedade culta é uma sociedade mais justa, menos violenta?
Já vimos que não há padrões. Os gregos fizeram uma separação entre eles e os bárbaros. E o que é o bárbaro? É um outro, com outra cultura e outra linguagem. Aquela linguagem que nós não entendemos. E eles podiam dizer de nós a mesma coisa. É como a relação entre patrões e criados: os patrões pensam que dispõem da lucidez, das boas maneiras, e que os criados são cegos. Não, foram é silenciados durante parte da história. Até que se revoltam, de forma violenta como Espártaco, ou caseiramente como nos romances do século XIX.

Na introdução que escreveu, quebra um pouco o otimismo do autor. Este diz-nos que a cultura está ao nosso alcance e o professor contrapõe que o nosso tempo é o da caverna de Platão, um tempo de aparências. Porquê?
Porque é o preço que pagámos por pensar que estávamos já na luz plena. A humanidade tem tendência a pensar que o ponto onde está é ponto ómega da história, e tal não existe. Na ordem cultural, não há como separar o positivo do negativo, o que nos perde do que nos salva, o que nos engrandece do que nos diminui. Essa é uma luta interna, e é uma luta que não tem sujeito. A humanidade inteira é assim.

Mas viver na caverna não significa vivermos enganados?
Só nos salvamos da caverna com a consciência de estarmos na caverna. Isto aplica-se à televisão: pensa-se que aquelas imagens são reais mas o real está lá fora, é o que ilumina o fundo da caverna. Para vermos o real, temos de voltar a cabeça para trás.

E estamos a olhar para a frente?
Estamos sempre a ver as imagens, em vez de estarmos em contacto com a realidade.
A dada altura, constata que nunca como hoje houve de forma tão marcada o oposto da cultura, que existe para nos distrair dela.
Em vez de a cultura ser aquilo que nos acorda, é aquilo que nos distrai — uma espécie de distração sublime. Nós podemos ser sufocados pela riqueza, como as abelhas no seu mel. Kierkegaard, autor que aprecio muito, ficou muito indignado porque o protestantismo na Dinamarca era vivido como se fosse água, como algo comum. Em vez de ser qualquer coisa que pusesse as pessoas em causa, era recebido como um caramelo.

É assim que vivemos hoje? Como “personagens de jogos de vídeo”, num presente que se basta a si próprio?
Um presente contínuo. Se a humanidade tem uma essência qualquer, é justamente ter memória de si mesma. Portanto, estamos a roubar a memória a nós próprios. Recorrendo a um exemplo extremo: a humanidade podia, praticamente desde que nasce até que morre, estar a olhar para a televisão. Poderíamos passar uma vida inteira a assistir a um filme no qual somos os atores principais, sem vivermos nada. Este é um pesadelo tão grande como o de Kafka. Porém, não se deve fazer uma leitura totalmente negativista, porque nessa nova atividade o futuro está implicado. Isso é, como preconiza, o fim do sujeito cultural, com memória.
É para onde tendemos, nesta espécie de ludismo universal. O que não significa que não existam hoje pessoas que possam vir a ser os próximos Dante ou Proust. Penso que todos nós somos atores do cultural. Todos queremos estar nessa situação — nem que seja pela aberração ou pela diferença — que não faça de nós um robô, antes que as nossas invenções nos convertam num tipo de existência robótica.

Como se sai daqui?
Em última instância, o importante é a nossa relação com o outro. É não falhar a relação que estabelecemos com uma só pessoa. O resto virá por acréscimo.

Diz que o “fim da história” diagnosticado por Fukuyama é o fim do tempo europeu e o início de um “antitempo” americano. Quer explicar?
O “fim da história” é uma ideia que vem de Hegel e que foi retomada por Marx. É o fim de nós enquanto incapazes de nos apropriarmos plenamente do nosso destino. Até agora, a história humana é a história da nossa própria escravidão. O fim da história é o acordar desse longo período de escravidão para reconhecer as exigências do real. A história é uma luta entre quem tem e não tem poder. E os EUA, já na Grande Guerra mas sobretudo na II Guerra Mundial, ficaram com a possibilidade de condicionar o destino da humanidade. Assumiram esse papel, que originou um paradigma cultural. A expressão mais lúdica de todas, o cinema, mostra-o bem. O grande acontecimento deste ano foi o “Star Wars”. Quando estava a ver o filme, pensava para mim: na Europa andamos há muito vestidos de americanos. É que, mesmo que os europeus quisessem — e não por falta de talento —, não poderiam fazer um filme como aquele. A América sente-se mesmo responsável pela marcha do mundo.
E a Europa não?
A Europa esteve várias vezes à beira do abismo. E agora estamos à espera que acorde. Tem um passado que é como as asas longas do albatroz de Baudelaire: impede-a de marchar. A humanidade habituou-se a conhecer a sua própria história como uma sucessão de impérios, e cada um pretendia ser o último. Desta vez, os Estados Unidos são mesmo o último império — ainda que provavelmente já numa fase crepuscular. Mas, sabe, no outro dia, no centenário de Frank Sinatra, prometi nunca mais dizer nada de negativo contra os americanos.

Porquê?
Porque pessoas como Sinatra são um fenómeno só americano. É um sujeito que parte do nada, europeu, e que por uma qualidade, um talento, conquista aquele país. Este é o triunfo da Europa na América, mas também da América sobre a Europa.